27.1.06

Destaque- A avenida que não cabe em si

No Público

por Jorge Marmelo
Câmara do Porto defende obras na Avenida dos Aliados
Argumentação apresentada em tribunal desautoriza anterior intervenção da autarquia
A Câmara Municipal do Porto considera "extemporânea" e "destituída de fundamento" a acção cautelar interposta, em Dezembro último, contra as obras em curso na Avenida dos Aliados, defendendo a intervenção em função das alterações impostas pela construção da estação do metropolitano.

A posição da autarquia, refira-se, resulta de uma sugestão apresentada pela promotora da empreitada, a Metro do Porto, ao Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que decidiu acolhê-la e permitir que, mesmo não sendo requerida no processo, a câmara pudesse apresentar a sua contestação, o que fez no passado dia 17.
Na contestação apresentada, a autarquia considera que os motivos do processo são "de natureza meramente estética e conceptual" e que, portanto, nada têm a ver "com a legalidade da actuação das entidades" responsáveis pelo avanço da obra - a Metro do Porto, o Ippar (Instituto Português do Património Arquitectónico) e a Câmara do Porto -, não cabendo aos tribunais dirimir conflitos desta natureza. Do ponto de vista legal, é ainda considerado que a legislação não obriga a que as operações de requalificação urbanística sejam objecto de estudo de impacte ambiental (EIA). O advogado da autarquia, Tiago Meireles de Amorim, recorda ainda que o EIA do projecto do metropolitano não poderia fazer qualquer referência a estes trabalhos, uma vez que os mesmos não integravam o objecto inicial da Metro do Porto.
A argumentação recorda, aliás, que outros trabalhos do género foram realizados na cidade do Porto e nos outros concelhos abrangidos pelo projecto do metro "sem que ninguém pusesse em causa a sua legalidade". Por outro lado, recordando que a configuração da praça tem sido, ao longo do tempo, objecto de diversas modificações, a autarquia considera ainda que só o conjunto edificado da Avenida dos Aliados está protegido pelo processo de qualificação patrimonial em curso, sendo mesmo referida a possibilidade de o mesmo ter já caducado.
Assim, em função da construção da estação do metro na Avenida dos Aliados, a autarquia considera que "a superfície tinha que ser objecto de um qualquer arranjo, destinado a apagar as feridas e as sequelas" da construção. Nesse sentido, entendeu por conveniente aproveitar a "oportunidade irrepetível" para reordenar o espaço em função dos condicionamentos resultantes da abertura das bocas de acesso à estação, tendo o estudo respectivo sido encomendado ao arquitecto Siza Vieira pela Metro do Porto, com o acordo da câmara.
A edilidade afirma, de resto, que, a implantação das bocas de acesso à estação tornou impossível manter o anterior arranjo, implicando, por si só, o alargamento dos passeios laterais e o "emagrecimento" da placa central. A argumentação municipal considera mesmo que a eventual opção pela manutenção da superfície da praça tal como estava equivaleria a "meter o Rossio na Betesga".
Mais curioso é o ponto em que a autarquia defende a "razoabilidade e racionalidade" de todo o processo, procurando que as obras em curso fossem feitas "no mais escrupuloso respeito" pelas intervenções anteriormente promovidas pela Porto 2001 na Baixa da cidade. "Seria estranho, para não dizer bizarro", lê-se na contestação, que as obras da Capital da Cultura e do Metro "não obedecessem a um elementar princípio de congruência". Este princípio, recorde-se, foi posto em causa pelo próprio presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, quando, há cerca de quatro anos, decidiu deixar na gaveta o projecto que a Porto 2001 tinha encomendado para a Praça de Carlos Alberto, preferindo, apesar das bocas de acesso ao parque de estacionamento subterrâneo, reconstituir a praça quase tal como existia antes.

A argumentação municipal considera ainda que a providência cautelar é destituída de eficácia, uma vez que os antigos elementos arquitectónicos da praça (passeios e canteiros ajardinados) estão já destruídos. "Ou a situação é, como defendem os requerentes, totalmente reversível e, então, as presentes obras não criam nenhum facto consumado. Ou a situação, como sustenta a contra-interessada, não é reversível por motivos de ordem técnica (...) e, então, não subsiste qualquer situação a tutelar (o facto já está consumado e não pode ser evitado)". »

No Jornal de Notícias

«Processo de classificação dos Aliados já caducou (no JN)
Câmara diz que tudo aponta para a caducidade do procedimento, que se deve aos edifícios e não ao arranjo de superfície da avenida e das praças
O
conjunto da Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados e Praça do General Humberto Delgado estão em vias de classificação desde 1993. Feitas as contas e numa análise estrita à Lei de Bases do Património Cultural (Ler "O que diz a lei"), a Câmara portuense argumentou - na contestação às providências cautelares interpostas no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto para travar a intervenção nos Aliados - que "tudo aponta para que tenha ocorrido já a caducidade do procedimento de classificação".
De qualquer modo, a autarquia entende que o processo de classificação, aberto pelo Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), deve-se ao "impressionante e monumental" conjunto de edifícios e não ao arranjo de superfície da avenida e das duas praças. "
É que, para quem conhece a história daquele conjunto de praças e avenida, não há ali, ao nível dos arranjos de superfície, nenhuma tradição estabelecida", pode ler-se na contestação, a que o JN teve acesso, adiantando-se "O que foi sempre protegido é o conjunto edificado. (...) Nada tem a ver com a concreta configuração da superfície, a qual, mercê dos imperativos do trânsito e de obras as mais várias, já foi objecto das mais diversas intervenções".

A autarquia não tem dúvidas, então, que os requerentes das duas providências cautelares (as três associações cívicas Campo Aberto, GAIA e APRIL) "não conseguem discernir qual o exacto bem patrimonial que está em vias de classificação", considerando que a objecção ao projecto de Álvaro Siza e Souto Moura para a avenida tem por base apenas concepções estéticas, sem fundamentação legal. Acusa, ainda, as associações de fazerem "remoques" que "causam dano" aos dois arquitectos nas providências cautelares. "As divergências estéticas e conceptuais são legítimas, quiçá desejáveis; o remoque, a graçola e a insinuação devem merecer forte reprovação e indiciam o verdadeiro ânimo de quem deles se socorre", refere-se ainda.

Efeitos perniciosos
Sob a convicção de que, face às alterações introduzidas pela Metro com a construção da estação subterrânea dos Aliados, está "tecnicamente comprometida a reconstituição do anterior arranjo" da avenida e das praças, o Município crê que os dois arquitectos são "especialistas que dão todas as garantias de qualidade e de respeito pelos padrões culturais e patrimoniais da cidade".
Caso a razão esteja do lado das associações, a Câmara deixa o entendimento de que a suspensão dos trabalhos dos Aliados prejudicaria o interesse público, recordando que as obras da Empresa do Metro e da Porto 2001 "tiveram efeitos perniciosos sobre a circulação, o comércio tradicional e o turismo. A persistirem e prolongarem-se no Porto, de forma indefinida e com um cutelo judicial sobre o pescoço, trarão danos incalculáveis às populações". Defende que afectará, igualmente, o "esforço de reabilitação urbana" e impedirá o Porto de ter "uma obra emblemática da sua Escola de Arquitectura".

O que diz a lei -Contestação da Câmara
"Nos termos estritos do artigo 24º da Lei de Bases do Património Cultural, e em especial do seu nº 5, tudo aponta para que tenha ocorrido já a caducidade do procedimento de classificação". Lei 107/2001 No artigo 24º, diz que o procedimento de classificação deve ser concluído no prazo de um ano, embora possa ser prorrogado. A caducidade do processo terá de ser definida pela Administração Central.»


A ler: A avenida que não cabe em si

26.1.06

Revista de blogues

25.1.06

A avenida que não cabe em si

Apesar de a Câmara Municipal do Porto (CMP) não ser alvo da acção cautelar por nós interposta a 12 de Dezembro, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, seguindo a sugestão da Metro do Porto, decidiu dar-lhe oportunidade de também apresentar o seu contraditório, o que ela fez a 17 de Janeiro (texto integral aqui em formato pdf).

Se atendermos ao ritmo acelerado das obras, temos que considerar este novo episódio processual como uma bem sucedida manobra dilatória. Por isso é pouca a paciência para rebater ponto por ponto um texto que em grande parte repisa e mastiga o que já foi dito nos outros contraditórios (pdf) e foi por nós oportunamente contestado. Ressalvando pois que o que mais importa neste novo documento é o arrastamento de prazos que acarreta e não o conteúdo, não podemos deixar de assinalar alguns aspectos:
  1. Ao passo que a Metro do Porto ainda tenta tortuosamente convencer o tribunal de que teria respeitado as condições impostas na Avaliação do Impacte Ambiental (AIA), a CMP deixa cair a máscara: a AIA não foi nem tinha que ser respeitada, pois inicialmente não se previa que a Metro do Porto executasse obras de requalificação urbana, e estas por si só não têm que ser sujeitas a qualquer AIA. Além do mais, acrescenta a CMP, as condições impostas no AIA no que toca à superfície da Avenida (reposição da pré-existência - ou seja, do jardim e da calçada) são da ordem do senso comum e não têm cariz especificamente ambiental.
  2. Tal reposição da pré-existência, segundo a CMP, revelou-se impossível com a colocação das saídas da estação de metro nos passeios laterais, que terão obrigado ao alargamento desses mesmos passeios e ao consequente estreitamento da placa central.
  3. Ora, sabemos hoje que, no projecto submetido a AIA, as saídas se faziam na placa central. Caso houvesse obstáculos de monta à solução então preconizada, seria inconcebível que eles não fossem reconhecidos e inventariados pela AIA; por isso, a posterior mudança para os passeios laterais, em flagrante violação da AIA e motivada certamente por considerações estéticas, estava longe de ser uma inevitabilidade.
  4. Mesmo o alargamento dos passeios não tem como corolário imediato o estreitamento da placa central - se, como é razoável, as faixas de rodagem diminuíssem de três para duas. E, mesmo admitindo a asneira do estreitamento da placa central, ela só ocorre na parte superior da Avenida dos Aliados, e não pode justificar a destruição dos jardins e da calçada portuguesa em todo o espaço da Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade.
  5. Num esforço retórico pitoresco, a CMP considera (art.º 57) que manter na Avenida os mesmos elementos que antes a constituíam seria «como meter o Rossio na Betesga». Aqui está um fenómeno a merecer estudo: por força de uma alteração afinal mínima no perfil da Avenida, ela deixa em absoluto de caber em si própria; não sobra espaço nem para uma flor.
  6. A CMP (nos art.ºs 66-68) lê uma intenção irónica, de causar «dano e menoscabo» ao visado, na expressão grande Arquitecto que aparece no texto da primeira acção cautelar - e, para reforçar essa sua interpretação, põe, na palavra grande, uma maiúscula inicial ausente nesse texto. É como quem diz: na boca irreverente do ímpio, a invocação da divindade só pode ser blasfémia; ou, em registo mais terra-a-terra, o respeitinho é muito lindo. Fica-nos a lição: cabe aos arquitectos o direito inalienável de fazerem o mal que quiserem à cidade; e toda a discordância, toda a oposição, toda a reacção de desagrado serão equiparadas a crimes de lesa-divindade.
  7. Registe-se o cinismo com que a CMP (nos art.ºs 83 a 85) refere «um amplo e estimulante debate público sobre o projecto em causa» - apesar de bem sabermos como o estímulo se revelou insuficiente para que o projecto sofresse qualquer alteração significativa -, chegando ao ponto de apresentar, como parte e certidão de existência desse mesmo debate, o processo judicial em curso.
  8. Finalmente, a CMP considera ser só pelos edifícios que o conjunto Avenida dos Aliados / Praça da Liberdade se encontra em vias de classificação . Mesmo que isso fosse verdade - e nada indica que o seja, pois nem o próprio IPPAR alguma vez o afirmou - o espaço público do local estaria obviamente abrangido pelo perímetro de protecção dos edifícios. Nem a CMP parece muito segura da força do seu argumento, pois logo em seguida acrescenta: «tudo aponta para que tenha ocorrido já a caducidade do procedimento de classificação» (art.º 133). É sem dúvida edificante: a CMP, para não atrapalhar a destruição em curso, desvaloriza o local mais emblemático da cidade, admitindo que ele já não esteja em vias de classificação. Quem sabe se o IPPAR não agarra a ideia, livrando-se de vez da incómoda obrigação de proteger este nosso património.

(arquivado em Os Aliados e a Justiça -outros ÍNDICES)

24.1.06

Praça da Liberdade - Janeiro 2006




Enquanto lá em cima o modelo é francês, aqui na Praça parece que é italiano ou espanhol, a crer pela projecção de slides com que brindaram a assistência no dia da apresentação em Março, e depois na Assembleia Municipal extraordinária de Junho. Tal como na Avenida dos Aliados, da Praça que conhecíamos apenas sobram os passeios e já todos abocanhado.

22.1.06

No alto da Avenida...

.........a demolição por assim dizer terminou, faltando apenas completar a destruição dos passeios. Na parte central estão agora a lançar as pedras para este novo espaço que, por alegadamente ficar mais amplo, nos vai possibilitar um mais intenso exercício do nosso "direito de cidadania enquanto cidadãos". (João Rodeia, ex. Presidente do IPPAR cf. aqui). Já se vê a escavação para a fonte (lago, espelho de água ou lá o que é) inspirada na Fonte de Médicis, do Jardim do Luxemburgo que, também alegadamente, ficará rodeada de um "bosque" (cf. Oliveira Marques, cf. aqui).

Mais abaixo, ensaia-se a colocação da calçada de granito em forma de "cauda de pavão"-que de genuinamente português não sei se tem alguma coisa, mas também não interessa (eu pelo menos vi-a a pavimentar a praça em frente ao Centre Pompidou, neste Verão, mas isso não quer dizer nada, claro; foi apenas uma associação, pois para além da fonte de inspiração francesa também nos prometeram um verde subido como nos Campos Elísios, por isso compreende-se)


Sendo evidente a vontade de acabar com tudo o mais depressa possível, numa condenável e desrespeitadora estratégia de facto consumado (apesar das providências cautelares, do relatório final da Comissão Parlamentar, da queixa ao procurador distrital, etc.) -até nem me admirei que se estivesse a trabalhar ao sábado de manhã (como se sabe neste caso até ao domingo se trabalha... ). Mas de tarde o afã continuava, e realmente nunca tinha visto um número tão elevado de pessoas e máquinas a movimentarem-se nas obras da Avenida dos Aliados e da Praça da Liberdade.

(as fotos desta última, que se publicarão em breve, não são aconselháveis a pessoas sensíveis)

19.1.06

"...qualificação em termos do aumento do espaço público..."

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Segundo o "projecto de execução das obras em curso" a que tivemos acesso por solicitação feita à Camara Municipal do Porto, ficámos a saber que afinal o estreitamento da placa central ocorre apenas na parte superior da Avenida dos Aliados. Assim sendo, não corresponde à verdade dizer-se (como o têm feito os representantes da CMP, da Metro e do IPPAR, invocando esse facto como uma espécie de "justificação") que a destruição e a total supressão da zona ajardinada com canteiros, na placa central onde se encontram as estátuas de Henrique Moreira, se deve(u) a "razões de escala", ou seja, ao facto de se ter que alargar os passeios e por isso se ter que estreitar a placa.
Aqui vai ficar uma eira de pedra com assinatura, mas não se preocupem pois, como explicou o representante do IPPAR na Comissão Parlamentar da Educação, Ciência e Cultura, «é uma qualificação em termos do aumento do espaço público disponível para as pessoas exercerem o seu direito de cidadania enquanto cidadãos, portanto mais possibilidade de encontro, mais possibilidade de passearem quer na placa central quer nas zonas laterais

Dêem-lhe os nomes de qualificação, requalificação, o que quiserem. Nós chamamos-lhe destruição, demolição! E desde o início achámos que era um presente envenenado!

18.1.06

Novo Índice - Os Aliados e a Justiça

Outros ÍNDICES

17.1.06

Os Aliados e a Justiça: novos documentos

1) Como já antes referimos, as associações cívicas APRIL, Campo Aberto e G.A.I.A. entregaram em 6 de Janeiro, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, uma nova acção cautelar pedindo a suspensão de eficácia do parecer do IPPAR que autoriza as obras em curso na Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade. Concedido o necessário compasso de espera, disponibilizamos neste endereço (pdf) o texto integral dessa acção.

2) Em 9 de Janeiro foi entregue no mesmo tribunal a resposta das associações aos contraditórios da Metro do Porto e do IPPAR: texto completo aqui (pdf) ou aqui (html) .

3) Quem precisar de rever a matéria pode ler aqui (pdf) o texto da primeira acção cautelar.

Frase # 29

«É preciso não violentar os muros bem fundados, ou o solo que os moldou e que moldaram - por obsessiva ânsia de uma modernidade tantas vezes desintegradora de construções e do seu assentamento, de jardins de praças, jardins de interior de quarteirão, terraços, encostas e perfis. E é preciso não construir desertos vedados, palácios desfigurados; sobretudo não construir mais do que o necessário....»
Siza Vieira -arquitecto (cf aqui)

Outras Frases

Aqui há Aliados!

16.1.06

"As duas torres"

«Não, não são as duas torres da trilogia do "Senhor dos Anéis".
Aquelas de que vos quero hoje falar são as que se encontram ao cimo da Avenida da Cidade, como era chamada, ainda em projecto, a Avenida dos Aliados. A tal que nos dias que correm está transformada em campo aberto de todas as contestações. Justas, diga-se de passagem. (...)» -ler crónica de Jorge Vilas no Jornal de Notícias

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Torre da Igreja da Trindade - Torre dos Paços do Concelho
Arquivado em HISTÓRIA ; outros ÍNDICES

15.1.06

Comentários a notícia

Tendo estado presente quando foram prestadas algumas informações ao jornalista, não posso deixar de "corrigir" o conteúdo da notícia saída no Público hoje com o título de "Obras dos Aliados podem chegar ao Parlamento":
1- O título: as obras dos aliados "não" podem chegar ao parlamento, a discussão deste assunto, JÁ CHEGOU AO PARLAMENTO na medida em que, na sequência do envio de uma petição com mais de 4500 assinaturas, a chamada "requalificação da Avenida dos Aliados e da Praça da LIberdade" foi debatido pela Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura (ler relatório final de 18 de Novembro). O que ainda nao aconteceu foi este caso ter "subido ao plenário" o que acontecerá em data próxima ainda não agendada.
2- Não é "A associação ambientalista Campo Aberto [que] está a tentar sensibilizar os grupos parlamentares a levar a questão das obras na Avenida dos Aliados a plenário, na Assembleia da República."! Nem tem havido reuniões "no Governo Civil do Porto com deputados de vários partidos eleitos pelo distrito". O que houve sim foi um pedido feito por representantes das associações APRIL , ARPPA, Campo Aberto, GAIA (responsáveios pelo envio do manifesto/petição para a Assembleia da República -ver aqui mais informações) à Sr. Governadora Civil do Distrito do Porto no sentido de possibilitar este encontro com os deputados do círculo do Porto para que possamos expor os nossos pontos de vista. Mas não houve ainda nenhuma reunião com os deputados!
3- Não foi a "Campo Aberto [que] interpôs a primeira providência cautelar a 12 de Dezembro". Mas sim as associações APRIL , Campo Aberto e GAIA.
4- Não se disse que "A Inspecção-Geral da Administração do Território também deve estar quase a pronunciar-se." O que foi afirmado por Maria de Carvalho é que NÃO se tem a mínima informação sobre a posição do IGAT. Recorda-se que segundo o relatório final o assunto foi comunicado à Inspecção-Geral da Administração do Território para que esta no quadro das suas atribuições e competências possa "analisar os procedimentos utilizados e tomar as providências que considerar adequadas".

Durante a conversa com o jornalista - por ocasião do convívio proporcionado pela inauguração .da sede .da Campo Aberto - aconselhámos a consulta deste blogue (que mais não é do que um dossiê virtual sobre o assunto) para esclarecimentos e precisões -e no fim, pedi explicitamente que fosse referido a sua morada (url). Lamentamos que isso não tivesse acontecido (e esperamos que o simpático jornalista não leve a mal estes reparos...)

14.1.06

Opinião # 30- "Património vs Progresso"

Por Tiago Oliveira -aluno de Conservação e Restauro
«Temo não vir dizer nada de novo mas, e apesar de não possuir o dom da palavra, pretendo deixar aqui o meu parecer sobre esta problemática que nos toca a todos sem excepção.

Sou aluno de Conservação e Restauro e tenho sido educado, ao longo da minha licenciatura, a não restaurar. Parece uma contradição, não? Antes pelo contrário; deve ser imperativo o acto de conservar de preservar o existente – o tão afamado original em que muitos se refugiam ou que dele facilmente se esquecem. Apesar de se ter evoluído no sentido de novas técnicas de Restauro cada vez mais inócuas e reversíveis, não será por esse motivo que se vai começar um desenfrear de intervenções "em nome do progresso" destruindo (sim, não se trata de desfigurar ou transformar, antes destruir) tudo o que de belo e excepcional se fez pela Cidade e que nos torna (re)conhecidos no estrangeiro.

Não quero, contudo, dizer que o património seja um entrave ao progresso. No meu entender, o progresso só é atingido, no seio de uma cultura civilizada, quando se alia ao património cultural e não quando o destrói. Falemos da Praça dos Leões que se tornou uma enorme praça, ampla sim, mas inerte; falemos do Edifício do Relógio (onde agora está a Casa da Música); falemos da Avenida Nova que começa no Nó de Francos e se prolonga até ao INATEL que, não fosse uma população atenta, corria o risco de também desaparecer (bem como o último reduto daquilo que foi em tempos uma grande Quinta).

Não seria mais produtivo fazer a limpeza das fachadas tão enegrecidas pela poluição que tornam a cidade cada vez mais sombria, uma cidade a que muitos se dirigem como Romântica? Só falta agora substituir os eléctricos velhinhos por uma versão reduzida do Metro… sim, suponho que os carris espalhados pelas ruas da Cidade sejam para o eléctrico. Veremos!

O que quero dizer, no fundo (do ponto de vista ético-moral), é que progresso e património devem coexistir, se possível, na Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade. O Metro está enterrado (e é útil digam o que disserem), porquê enfiar no mesmo saco a requalificação da superfície? É para melhor, dizem uns… não creio! E tal se tem comprovado pelo crescente número de comentários que têm vindo a ser feitos ás obras em questão.
A Esperança é a última a morrer!

Os portugueses sempre se refugiaram no passado. Há que dar passos para a frente mas controladamente e sem desvirtuar espaços ou caluniar o Porto, cidade Património Mundial…»
Outras OPINIÕES

13.1.06

Opinião # 29


Quero, posso, mando... Quero, posso e faço! !
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Magnólias no Verão passado


Magnólias em canteiro com petúnias e Estátua de homenagem ao "Ardina . do Porto" (ca 1990 cf), obra do escultor Manuel Dias
Supomos -pela consulta do projecto- que afinal as magnólias em frente à Igreja dos Congregados não estão condenadas e vão ter licença para florir. (Supomos porque informação clara e respeitadora é coisa que não existe neste triste processo, e nada nos afiança que resolvam mudar). Dos canteiros é que não se vê rasto no dito plano, mas isso não foi surpresa nenhuma: os arquitectos já tinham avisado que iriam eliminar os "canteiros e canteirinhos". Estes e todos os outros da Praça e da Avenida.
Numa cidade com um dos melhores viveiros municipais do País e com uma tradição da arte floral que importaria acalentar e dar a conhecer, a erradicação de umas das suas zonas ajardinadas mais emblemáticas confirma o que não aceitamos e contestamos: Os arquitectos estão a adaptar os Aliados ao projecto deles e não o contrário!

11.1.06

As magnólias estão salvas

Em resposta ao pedido que há tempos fizemos de acesso a documentos administrativos relacionados com o processo dos Aliados, a Câmara Municipal do Porto permitiu-nos, na passada segunda-feira (9 de Janeiro), consultar o projecto de execução das obras em curso - mas não os ofícios trocados entre a Câmara, a Metro e os arquitectos. Curiosamente, esse projecto de execução foi emitido pelos gabinetes de Siza Vieira e Souto Mouro em Julho de 2005, quando o IPPAR afirma, no seu último parecer, tê-lo consigo já em 9 de Junho.

Tirando isso, a consulta do projecto, ainda que tardia, permitiu verificar como a imagem virtual do projecto - até hoje a única divulgada publicamente -, além de insuficientemente detalhada, contém incorrecções importantes, uma delas até muito bem-vinda. As novidades mais assinaláveis são as seguintes:

- as esplêndidas magnólias junto à Igreja dos Congregados afinal não serão removidas (perguntámos tantas vezes por elas, não nos podiam já ter esclarecido?);

- com excepção das magnólias, o projecto prevê a substituição (por carvalhos americanos, Quercus coccinea) de todas as árvores na Praça da Liberdade;

- o estreitamento da placa central ocorre só na parte superior da Avenida, e por isso é pura falácia dizer-se que na zona mais baixa, onde a placa central mantém as mesmas dimensões, se suprime o jardim por razões de escala;

- quanto à placa superior, só estão previstas árvores no seu extremo norte, em torno do espelho de água, ficando tudo o resto despido, ao contrário do que mostra a imagem virtual;

- refira-se, finalmente, que as novas árvores na Avenida serão da mesma espécie das já existentes (Acer platanoides "Crimson King").

Opinião # 28 -"Respeitar o espaço público"

Por Gomes Fernandes- arquitecto - no Jornal de Notícias de hoje (11.01.06)
«Sabe-se pouco do que se está a passar na Avenida dos Aliados e na Praça da Liberdade
A fotografia é muito bonita e já antiga, mas retrata um quadro urbano de grande beleza e rigor de desenho, que, infelizmente, está em vias de delapidação, a cargo de dois dos mais prestigiados arquitectos portuenses contemporâneos.

Duvido que Siza e Souto Moura tenham olhado para ela, não só com "olhos de ver", mas sobretudo com olhos de compreender!

Sabe-se pouco do que se está a passar na Avenida dos Aliados e na Praça da Liberdade. O que mais vem ao conhecimento é que há polémica e contestação, que as coisas se arrastam pelas avenidas do contencioso, que o IPPAR (o mesmo do Túnel de Ceuta, não esqueçam!) meteu "os pés pelas mãos" numa manifesta incapacidade de leitura e análise cultural, a Câmara o que quer ver é a obra arrumada sem gastar um euro (louvável contabilisticamente, mas subserviente legal e urbanisticamente!) e o cidadão comum, que já acredita em muito pouco, não anda longe da posição camarária, ou seja, arrumem o assunto depressa que a paciência se esgota.

Mas a cidade ficará a perder e não é pouco. Embora, já é algum ganho ou menor prejuízo, conste que "o cavalo de D. Pedro IV" e este, porque está montado nele, já não vão ser virados ao contrário, ao que dizem, por custar muito dinheiro que a sociedade "Metro do Porto" tem agora de gerir sob maior controle. Apoio tudo que seja economizar dinheiros públicos para os aplicar melhor no interesse público, mas lamento que tenha sido sequer colocada tal hipótese pelos arquitectos, pois se D. Pedro e o seu corajoso cavalo estão naquela posição ela tem razões e justificação histórica, não foi só para virar "o rabo do cavalo" à Câmara, que, na altura, estava logo atrás, mais ou menos no local da "Menina Nua".

Com sabem, a resistência liberal do Porto, comandada pelo "rei soldado", foi sofrida porque da outra banda, na "Serra do Pilar", os miguelistas tinham instaladas as baterias de artilheiros que iam bombardeando a cidade. Ora, a posição da "Estátua de D. Pedro IV" tem a ver precisamente com isso, uma afirmação de liderança e resistência contra quem atacava a partir do sul. Não é a única razão, mas esta é histórica e forte e não deveria ter passado à margem da análise urbanística de tão responsáveis arquitectos e professores.

Esta foto revela mais algumas lições que parecem agora esquecidas O tratamento da centralidade axial do desenho da Avenida e da posição do monumento na Praça; a coexistência na placa central entre o peão e as superfícies ajardinadas; o primoroso desenho do espaço, que embora datado é sempre uma lição de rigor e beleza; a luminosidade clara e reflectora dos pavimentos em contraste com o tom mais escuro dos edifícios, o que não foi escolhido por acaso; um fecho de fundo da Praça de grande monumentalidade e anunciador de fugas visuais convidativas no sentido transversal, dos Clérigos e 31 de Janeiro.

Tudo isto e muito mais, numa fotografia que poderia ser saudosa e salutar memória cultural da "sala de visitas" de uma cidade que sabe receber, mas que ficará só como "saudosa", porque "salutar" não a souberam entender os dois prestigiados arquitectos.

Fica uma vez mais em aberto uma questão fundamental é preciso que o Porto seja mais discutido, que haja maior e mais sereno debate sobre questões vitais do desenho e da transformação da cidade. Intervir no "Espaço Público" requer a presença obrigatória do arquitecto, mas não se esgota na sua mesa de trabalho. O destinatário é o cidadão, a quem se exige - como tal se deve conferir o direito! - uma responsabilização cívica e cultural e ela só pode ser garantida se ele tiver acesso à informação e conheça, atempadamente, as regras da participação.

Rigorosamente o contrário de tudo que foi feito pela "Porto 2001" e agora pela "Metro do Porto", e que poderia ter evitado algumas aberrações feitas, com custos que no futuro ainda vamos ter de amargar.»


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10.1.06

Notícias do terramoto do Porto

Manuel António Pina - no JN, 9 de Janeiro, segunda-feira

«Enquanto no Tribunal Administrativo continuam em apreciação as providências
cautelares apresentadas por cidadãos e associações cívicas, na Praça Humberto
Delgado, Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade
repetem-se as réplicas do
devastador Terramoto do Porto de 2005. Era o que faltava ao Porto para poder
rivalizar com Lisboa também na desgraça: um terramoto.

Com epicentro no gabinete de arquitectura de Siza e grau 4 milhões e uns trocos na escala
financeira da Metro, S.A., de modo a evitar os incómodos de uma avaliação do
impacto ambiental, o Terramoto do Porto já dura há quase um ano (o de Lisboa só
durou uns minutos...).

Velentim Loureiro/Oliveira Marques (Metro, S.A.), Rui Rio (Câmara), Elíso
Summavielle/Lino Dias (IPPAR) e Siza Vieira /Souto Moura, mesmo sem os recursos
de que dispôs a Divina Providência há 300 anos em Lisboa, conseguiram, com pouco
mais do que meia dúzia de retroescavadoras e meia dúzia de violações da lei,
"mais do que prometia a força humana": o coração histórico do Porto, esventrado
e mutilado, já mal bate
. Se os portuenses fossem agradecidos, deveriam pôr o
nome dos sete magníficos aos "Champs Elysées" à moda do Porto que Siza imaginou
para "recuperar a ordem perdida" do centro da cidade...»

Foto moderna

«Restituir à Praça a dignidade da sua placa central que, aos poucos, passou a uma nesga ovóide e vergonhosa Esperem por essa!
Outras fotos

Foto antiga # 25

Praça da Liberdade e Avenida dos Aliados- postal (anos? )
Outras fotos

9.1.06

"Uma cidade com respeito pela sua história"


Foto © Do tempo e da luz
Na parte superior da Avenida continua a "requalificação": depois de escaqueirarem o que restava da calçada começaram a cavar o local onde pretendem construir a fonte de inspiração francesa. Segundo o texto divulgado na revista de propaganda oficial da Câmara : «A Fonte, imagem evocativa de projecção da alegria comungada pela comunidade portuense, constituirá, por certo, mais um elemento iconográfico importante numa Avenida já de si carregada de fervores tripeiros e da persistência das memórias do orgulho português.»
Diga-se de passagem que esta revista no seu último número (Julho de 2005) ostentava o título "UMA CIDADE COM RESPEITOPELA SUA HISTÓRIA".
A cidade terá, quem o não tem, sabêmo-lo nós.

8.1.06

Frase # 28

«Grande "elite" essa que nos quer projectar para o futuro, sem passado
M.R.L. comentando aqui.

Outras Frases

Nos Jornais- "Braga da Cruz contra intervenção nos Aliados"

No Público por Nuno Corvacho
«A intervenção em curso na Avenida dos Aliados constitui "mais uma atitude predadora sobre valores" do Porto e é "perpetrada por quem tem responsabilidades" e revela "grande falta de respeito pelo que é emblemático na cidade".
Esta posição foi assumida pelo deputado socialista Luís Braga da Cruz, num texto anteontem enviado à associação ambientalista Campo Aberto, reflectindo uma posição anteriormente assumida no seio do grupo parlamentar do PS.
Em declarações ao PÚBLICO, o deputado do PS, que foi cabeça de lista pelo círculo do Porto nas últimas legislativas, lamentou que um
"lugar simbólico" como aquele tenha sido "estraçalhado" sem que o assunto fosse objecto de debate público. Embora não colocando em causa a eventual valia do projecto assinado por Siza Vieira e Souto Moura, Braga da Cruz considerou, no seu documento, que "não se pode mexer num local que é património sem explicar bem porque se faz, não bastando dizer que se enviou um desdobrável pelo correio".
O argumento avançado por alguns especialistas de que assim se dará uma maior
"coerência" ao referido espaço urbano é contestado pelo parlamentar do PS, que alega ser a coerência "não um conceito formal, mas aquilo que as pessoas construíram na sua memória colectiva". "Dói ver destruir património impunemente. Corta-se alma à cidade", afirma. E, lembra, os Aliados são "o ponto de referência por excelência dos portuenses, tendo sido apropriado pelos cidadãos do Porto, como ele é".
Por outro lado, a justificação do arranjo à superfície como consequência da necessidade de alargar os passeios laterais por causa dos acessos à estação subterrânea do metro não convence o deputado, que garante haver outras
"soluções técnicas" para contornar essa alegada inevitabilidade.
Braga da Cruz revela algum pessimismo quanto ao evoluir da situação, mesmo sabendo das iniciativas que um grupo de associações cívicas já moveu no foro judicial.
"A maior parte dos portuenses só vai dar conta do estrago físico e moral feito no seu património quando tudo estiver irremediavelmente perdido", cogita.
O deputado do PS receia que a intervenção nos Aliados já seja um facto consumado. E, mais grave ainda na sua óptica, para um acto como este, que representa
"a destruição de algo que tinha valor patrimonial", "há sempre um IPPAR disponível para se enrodilhar em explicações incompreensíveis". Decididamente, nesta questão o instituto a quem compete zelar pelo património "não procedeu bem", considera Braga da Cruz.»


Só faltava acrescentar: pode ler-se texto integral da posição do deputado do PS pelo Distrito do Porto no blogue ALIADOS- em defesa pela Avenida dos Aliados e pela Praça da Liberdade...

7.1.06

Vista aérea

Foto antiga do conjunto Pr. da Liberdade, Avenida dos Aliados e Pr. Humberto Delgado já anteriormente publicada aqui

Opinião # 27- Aliados sem aliados

por António Pinto Gonçalves (publicado no Correio dos Leitores na edição impressa do JN no passado dia 30 de Dezembro de 2005)
«Há cerca de meia dúzia de anos lamentava-se, nos jornais, o facto do Arq. Sisa Vieira ser autor de obras espalhadas por vários países e no Porto não lhe ser dada a oportunidade de mostrar o seu valor com obra emblemática. Pois bem, foi-lhe atribuída a renovação da baixa portuense que certamente irá perpetuar o nome de Sisa Vieira e Souto Moura não pelas melhores razões – destruição dos jardins e da calçada portuguesa com os seus maravilhosos desenhos substituídos por cinzentos cubos de granito na Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade.
A indignação é grande daqueles que realmente amam o Porto, os outros querem é obras de qualquer jeito. Os artigos de opinião nos jornais são todos contra a destruição de jardins e da calçada, que está em curso. Eu sei que não se quer beliscar os protagonistas, dizendo alguém no “Passeio Público” que não concordando com a alteração também não concordava com a campanha contra o “sizentismo”. Outro articulista dizia que também não concordava mas apontando que as alterações de hoje poderão no futuro ser ex-libris – certamente não estaria a pensar no pavilhão Rosa Mota que substituiu o “Palácio de Cristal” esse sim ex-libris.
É de lamentar que os belos jardins com canteiros de flores sejam sistematicamente eliminados para dar lugar a granito, transformando o que antes era verdura em eiras de pedra..

A sala de visitas do Porto ficará adulterada, mais pobre. Será que quem tem poder de decisão baixa os braços? »

Nos Jornais-"Nova acção para travar as obras nos Aliados"

No Jornal de Notícias po Carla Sofia Luz
Associações reclamam a suspensão de eficácia do aval do IPPAR
No processo, lembram que destruir património em classificação é "crime"

As três associações cívicas
Campo Aberto, APRIL e GAIA não desistem de parar a obra de requalificação dos Aliados (Porto). Foi já com os trabalhos em curso que o Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) concedeu o parecer favorável à reconversão da avenida (a decisão data de 13 de Dezembro do ano passado). Ontem, as associações interpuseram, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, uma nova providência cautelar para suspender a eficácia da recente autorização, dada pelo IPPAR, e para travar a empreitada.

"Era indispensável apresentar esta acção, pois, de outro modo, o parecer do IPPAR nunca seria contestado. A segunda providência cautelar possui um efeito suspensório imediato da autorização, dada pelo instituto, que está a permitir que a obra se faça na Avenida dos Aliados. Se assim for, a obra devia parar", explica Paulo Araújo, da associação Campo Aberto.

Por lei, logo que a Empresa do Metro seja notificada do pedido de supensão de eficácia pelo tribunal, é obrigada a suspender os trabalhos. Só poderá retomá-los se o juiz entender, após um requerimento da empresa, que a paralisação da intervenção prejudica o interesse público. Um reinício sempre condicionado à decisão final do tribunal sobre a suspensão ou não da eficácia do parecer favorável do IPPAR.

Lei prevê multa ou prisão
Na providência, as associações, representadas pelo jurista Paulo Duarte, destacam que o principal objectivo é
"evitar a consumação da destruição irreversível de uma das partes mais nobres do coração histórico da cidade" . Certas de que a execução do projecto dos arquitectos Álvaro Siza e Souto Moura será a "consumação de um atentado ao património cultural e ambiental", defendem que o aval do IPPAR é um "acto manifestamente ilegal" por desrespeito da lei do património cultural.

Além dessa violação, apontam para o Código Penal.
"Quem destruir, no todo ou em parte, danificar, desfigurar ou tornar não utilizável coisa pertencente ao património cultural e legalmente classificada ou em vias de classificação é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias", pode ler-se na providência cautelar.

Embora o IPPAR considere que a obra em curso é uma requalificação e não uma demolição, as associações contrapõem que
"todos os elementos do espaço público" do conjunto da Avenida dos Aliados e das praças da Liberdade e de General Humberto Delgado, em vias de classificação desde o ano de 1993, será destruído pela intervenção.

"Transformar um conjunto constituído por duas praças e uma avenida numa alameda, remover calçadas (...), desfazer passeios, arrasando os pavimentos e os respectivos perfis consiste, evidentemente, em 'destruir uma construção incorporada no solo com carácter de permanência' [definição de edificação no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação]. Consiste, numa palavra, em demolir", refere-se no documento "Uma vez distinguido um qualquer bem com a honra da classificação (ou do juízo preliminar que o coloca em vias de classificação), jamais o IPPAR poderá autorizar qualquer intervenção que o destrua, o danifique ou, simplesmente, o desfigure".


Ver IPPAR e os ALIADOS

6.1.06

Opinião # 26- Avenida dos Aliados

Posição assumida pelo Deputado Luís Braga da Cruz

«Depois de ler com cuidado todos os elementos que foram produzidos sobre a audição das ONG’s do Porto, na Comissão Parlamentar de Educação e Cultura da Assembleia da República, relativa à intervenção perpetrada na Avenida dos Aliados pela empresa Metro do Porto, a pedido da Câmara Municipal do Porto, assumo a posição seguinte:
1. Na
resposta da Câmara é assumido que a responsabilidade é da Câmara e não do Metro, o que é positivo.
2. Porém, também fica claro que as indicações que podem ser consideradas como orientação, ou programa dado aos arquitectos, são de tipo formal e meramente técnicas.
3. O que é grave, na minha opinião, é não se identificarem nesta preocupação considerações que possam ser entendidas como opções de natureza política, em relação ao valores de carácter patrimonial.
4. A Praça dos Aliados é o ponto de referência por excelência dos Portuenses. Foi apropriado pelos cidadãos do Porto, como ele é. Não se pode mexer num local que é património e que tem valor simbólico, sem explicar bem porque se faz (não basta dizer que se enviou um desdobrável pelo correio).
5. A maior parte dos portuenses só vão dar conta do estrago físico e moral feito no seu património, quando tudo estiver irreparavelmente perdido.
6. Trata-se de mais uma atitude predadora sobre valores da cidade e perpetrada por quem tem responsabilidades e que actua em atitude de grande falta de respeito pelo que é emblemático na cidade.
7. Os argumentos que são usados garantindo que a intervenção procura conferir coerência a uma série de espaços urbanos que nunca tinham experimentado um esforço de integração, não me parece válido porque a coerência não é um conceito formal, mas sim o que as pessoas construíram na sua memória colectiva.
8. Repare-se que em toda a argumentação se sucedem considerações técnicas que se implicam em sequência, sem se demonstrar que era inevitável a primeira opção, que desencadeia todo o processo – de implantar as bocas do metro nos passeios, quando havia outras soluções para o problema.
9. Fala-se muito em mimetismo, para dizer que não se podia rematar o novo com o padrão anterior, mas no entanto o que resulta é uma obra de intervenção radical e não de uma intervenção pontual ou de uma recuperação.
10. Dói ver destruir património impunemente. Pode ficar formalmente correcto, mas corta-se alma à cidade.
11. O que está em causa não é a qualidade do projecto, mas a legitimidade de um acto de destruição de algo que tinha valor patrimonial… e há sempre um IPPAR disponível para se enrodilhar em explicações incompreensíveis!
12. Estes comentários poderão ser entendidos como desabafos, mas são sentidos e produzidos por alguém que não gosta da forma como se estão a manipular questões muito sérias na cidade do Porto.

Luís Braga da Cruz -(Deputado do Partido Socialista, pelo Distrito do Porto)
23.Novembro.2005 »

"Links" da nossa responsabiliadade.
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Nos Jornais -"Acessos à estação 'forçam' requalificação dos Aliados"

No Jornal de Notícias por Carla Sofia Luz

Metro argumenta que a colocação das bocas de acesso à estação nos passeios laterais inviabilizaram a conservação do arranjo anterior da avenida e defende a solução final
A colocação dos acessos à estação subterrânea do metro nos passeios laterais dos Aliados - inicialmente, estavam projectados para a placa central - conduziu ao processo de requalificação da avenida e da Praça da Liberdade, no Porto. Na contestação judicial à providência cautelar para a paragem imediata das obras nos Aliados, a Empresa do Metro esclarece que a construção das bocas "inviabilizava por completo a conservação do arranjo anterior, designadamente por efeito do sensível alargamento dos passeios laterais e do visível estreitamento do passeio central".

Mudanças no jardim
Embora o estudo de impacto ambiental do sistema do metro ligeiro recomendasse a "reposição do status quo ante", a Metro entende que esse parecer servia para avaliar os impactos do sistema e não um projecto de requalificação urbana. A intenção era apenas de "garantir o bom ordenamento urbano e, na mais esticada das hipóteses, a preservação do património cultural".
À data do estudo de impacto ambiental, a solução final para a avenida "já preconizava alterações profundas na configuração do jardim, uma vez que eram introduzidas na placa central as obras de acessos por escadas, os elevadores e as grelhas de ventilação",
pode ler-se no documento, entregue no Tribunal Admnistrativo e Fiscal do Porto
. Mas não mexia na configuração da avenida e da praça. Para potenciar uma "maior mobilidade" dos utentes do metro no acesso à estação subterrânea, decidiu transferir-se as bocas da placa central para os passeios laterais.

"Nem a reposição integral pretendida pelos requerentes [Manuela Ramos, Paulo Araújo e as associações cívicas Campo Aberto, APRIL e GAIA] é tecnicamente viável nem a sua substituição tem qualquer relevância ambiental
*[ver-Nota 1]", considera a Metro, realçando que, "em estreita colaboração com o Município do Porto", foi solicitado aos arquitectos Álvaro Siza e Souto Moura que elaborassem o projecto de requalificação.
Por isso, a empresa defende que a Câmara não pode ficar afastada da contenda judicial. A providência cautelar, apresentada pelas associações cívicas, é contra o IPPAR e a Metro. "É inquestionável que o Município do Porto deve ser chamado à presente demanda. Nem no reino do absurdo se poderia conceber que o objecto de litígio não afecta directamente os interesses do Município do Porto, quando está em causa o projecto de requalificação de uma das partes mais nobres do coração da cidade", argumenta.
Certa de que colaboram com os "melhores técnicos nacionais e reconhecidos internacionalmente", a Metro não tem dúvidas de que a solução de Siza e de Souto Moura "não só mantém a vocação inicial de espaço público de lazer, como, pelas características do projecto, esta vocação é reforçada", respeitando o património edificado.»
(Destaques e ligações no corpo da notícia da noss responsabilidade )

* «(Nota 1- Deve, aliás, sublinhar-se que, nos termos dos arts. 4.º-k) e 17.º/3-b) da lei n.º 11/87, de 7 de Abril de 1987 (Lei de Bases do Ambiente), a noção legal de ambiente, enquanto bem juridicamente protegido, abrange, além do património natural, o património construído, em particular o património cultural. Sobre as relações de inclusão entre o direito do ambiente e o direito do património cultural, pode ver-se José Casalta Nabais, Noção e Âmbito do Direito do Património Cultural, in Revista do CEDOUA, Ano III, n.º 2, págs. 25 e ss.)» transcrito do Texto da petição apresentada no Tribunal Administrativo (requerimento inicial do processo cautelar preliminar à acção popular a instaurar contra o IPPAR, o MAOT e o Município do Porto)
Ler os nossos comentários aqui

5.1.06

Contraditório da Metro do Porto

Disponibilizamos neste endereço um ficheiro pdf com o contraditório da Metro à nossa acção cautelar, entregue em tribunal na semana passada e chegado às nossas mãos na terça-feira, 3 de Janeiro.

Não vamos fazer um comentário exaustivo a esta peça, até porque não é este o local para dirimir subtilezas jurídicas. De um modo geral, a peça - não fosse ser contra nós - até constituíria leitura divertida. Que leigo pode resistir a expressões tão deliciosas como a inutilidade superveniente da lide ou outrossim por excepção? Mas, falando sério, deixamos aqui algumas notas:

  1. Tal como no contraditório do IPPAR, faz-se grande alarido com a ultrapassagem do prazo legal para impugnar o parecer favorável emitido a 9 de Junho por esse organismo. Esse parecer do IPPAR foi alvo da nossa acção por ser o único existente à data em que a petição foi enviada para o tribunal, e porque era necessário confrontar o IPPAR com a sua actuação. O parecer instantâneo que o IPPAR emitiu mostrou que tínhamos razão: as obras nos Aliados decorriam sem a sua autorização e eram por isso ilegais.
  2. No que toca à violação do parecer final da Avaliação do Impacte Ambiental (AIA), a defesa usa dois argumentos:
    (i) As obras à superfície na Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade nunca justificariam, por si só, uma AIA; donde, não seria grave desrespeitar, nesta parte diminuta da grande empreitada do metro, as condições impostas na AIA. A ser aceite na jurisprudência, esta ideia incentivaria os promotores de qualquer obra de grande dimensão a dividi-la em pequenas parcelas, cada uma delas isenta de obedecer à AIA.
    (ii) Mais coisa menos coisa, as ditas condições teriam sido realmente cumpridas. Uma delas, recorde-se, impunha a reposição do jardim na placa central da Avenida dos Aliados. Essa imposição foi violada da forma mais ostensiva: além de não se repor o jardim no topo da Avenida, ainda se destruiu a parte do jardim que não tinha sido afectada pela construção da estação. Que não haja dúvidas: no futuro, a executar-se este projecto, não haverá qualquer jardim na Avenida dos Aliados, pois ninguém pode honestamente confundir um alinhamento de árvores em caldeiras com um jardim. Ninguém - excepto a Metro do Porto: lê-se no art.º 156 desta peça que, «onde antes havia placa central com jardim, o projecto em apreço mantém placa central com jardim». É preciso ter lata!
  3. A Metro do Porto reconhece que não houve discussão pública do projecto - nem, segundo ela, teria que haver: primeiro, é notório que transformar radicalmente o espaço mais emblemático da cidade não mexe de modo nenhum com a vida das pessoas; segundo, as obras estão (segundo notícias vindas a público) orçamentadas em quatro milhões e muitos euros, e só acima dos cinco milhões a consulta pública é obrigatória. Cabe aqui fazer três perguntas: (i) A primeira fase das obras (reconstrução e alargamento dos passeios junto às saídas da estação) teve custo zero? (ii) Os arquitectos trabalham de graça? (iii) A Metro do Porto garante que não haverá nesta empreitada a menor derrapagem orçamental?

A ler

Foto "antiga" - Junho 2005

Opinião # 25- O centro do Porto

"Crónicas portuenses" por Ilda Castro publicado n' O Primeiro de Janeiro em 1.1.06
«O centro do Porto
A Avenida dos Aliados é-o, sem dúvida, rematada pela Praça da Liberdade, tendo no lado norte, a termina-la o edifício imponente da Câmara Municipal e no lado sul o passeio das Cardosas, nome que lhe advém do soberbo e antigo Palácio do mesmo nome. Ela era de facto uma bela avenida que dois ilustres arquitectos, ambos com obras admiráveis, Souto Moura e Siza Vieira estão a transformar numa espécie de labirinto onde impera o cimento e o granito. Que saudade dos canteiros cheios de flores, dos bancos, das árvores que a embelezavam… Será que vai haver lugar para os mais velhos se sentarem, entretendo-se a dar de comer às pombas? Não vejo muito espaço para isso, mas como não sou arquitecta, espero, sinceramente que o erro seja meu. E, quando digo “erro”, digo-o convicta, porque uma avenida é um lugar para ser usufruído por toda a população e os velhos também são gente. Contudo, como ela ainda não está acabada, vamos esperar e ver.


Na dúvida, falemos de outro ponto de interesse para a nossa Avenida dos Aliados; ela tem duas belas estátuas a adorná-la as quais, graças a Deus, pelo menos até ao momento resistiram, incólumes à ânsia de modernização que parece ter ditado a traça da parte central da Avenida desde as ruas Magalhães Lemos – Elísio de Melo até à Praça Umberto Delgado: a norte a belíssima estátua de Almeida Garrett, escritor e político de renome internacional, um dos nomes grandes da nossa literatura, tribuno notável e a tão conhecida estátua da Menina Nua rematando a parte ajardinada do fim da Avenida; da autoria do escultor Henrique Moreira ela representa tão somente a juventude. A modelo, Aurélia ou Lela como era chamada pelos amigos, foi modelo de Henrique Moreira, mas também de outros escultores e pintores. Morreu cega aos 82 anos, mas conservou ao longo da vida uma alegria que lhe provinha talvez do facto de ter sempre encarado a vida sem tristezas ou pessimismos.
Sempre que eu passava junto à estátua, admirava o ar quase ingénuo e o sorriso entre tímido e alegre que o escultor conseguiu imprimir-lhe mas, quem ela era, quando morreu e que tinha morrido cega só o soube através dum artigo publicado por um médico psiquiatra que a tratou, o senhor Dr. David Torres. Ela foi consultá-lo quase com 80 anos e contou-lhe o que tinha sido a sua vida. Segundo ele, conservava um ar cândido, “quase ingénuo, bonito…”. Eternizou-o o escultor Henrique Moreira. Ao revê-la em pensamento, lendo a descrição do Dr. David Torres, não posso deixar de pensar que, geralmente o aspecto exterior reflecte a forma de ser das pessoas. Oxalá ela se conserve tal qual está e escape à fúria modernista.

E a Praça da Liberdade, remate perfeito da Avenida, irá escapar?
O cavalo e D. Pedro parece que vão dar uma volta para ficarem virados para a Câmara; naturalmente estão cansados do que têm visto até hoje. Eu creio que os portuenses ficariam bem mais contentes se, em vez de mudarem o aspecto da Avenida, transformassem a Praça Parada Leitão que está um deserto de betão e granito.
O Porto tem características próprias; querem modernizá-lo? Modernizem-no, mas não o desvirtuem.»

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4.1.06

Tristeza na Avenida

..

Nos Aliados continua a demolição... Depois das breves palavras à SIC e TVI (que nos tinham contactado por causa das últimas notícias) nem tivemos vontade de ir até à Praça. .


Fomo-nos abrigar da confusão do trânsito e da agressão das obras no Guarany onde lanchámos. Lá dentro, o ambiente composto e requintado constrastando com o desarranjo exterior, as pessoas sossegadamente a conversar, a luz do fim de dia já com promessa de Primavera... tudo isso me encheu (a mim também) de uma enorme nostalgia e imaginei como nos sentiríamos felizes se nesta altura, ultrapassada a fase da construção da estação subterrânea do metro, o que se estivesse a fazer fosse uma verdadeira requalificação. Imaginei como seria bom que os responsáveis pela autarquia, pelo IPPAR , pela Metro, os autores do projecto verdadeiramente amassem a sua cidade e estivessem a melhorar, a actualizar sem a destruir, a jóia que havia aqui neste espaço durante tanto tempo desvirtuado (fez em Dezembro quatro anos que se destruiram os jardins da parte superior da Avenida para se inicarem as obras da estação subterrânea).
Mas bastava ver o abandono a que foi votada, o desprezo com que a trataram (para nossa vergonha), o desrespeito com que dela falaram, para se perceber que ao "adaptar a avenida ao projecto deles e não o contrário", esta gente só pensa na sua "coroa de glória" (ouvi esta expressão a Souto Moura na Assembleia Municipal, referindo-se ao que esta obra poderia vir a significar para Siza Vieira) e no seu poderzinho sobranceiro, e que não entendem nem verdadeiramente sentem o Porto. Como disse Helder Pacheco (e que pena dizê-lo tão tarde!) e como já aqui e aqui foi transcrito :«(...) É preciso ter desaforo!»

3.1.06

A ler

O IPPAR e os Aliados: documentos & comentários

Conforme já foi aqui referido, e também noticiado no JN, a acção cautelar contra a Metro do Porto e o IPPAR apresentada no Tribunal Administrativo do Porto em 12 de Dezembro registou na semana passada uma importante evolução: pela resposta do IPPAR ao tribunal ficou-se a saber da nova (quase repentina) autorização emitida por esse organismo para as obras nos Aliados.

Divulgamos de seguida os documentos novos mais importantes do processo. Os dois primeiros são documentos do IPPAR; do terceiro, parte de uma Resolução do Conselho da Europa citada na resposta do IPPAR ao tribunal, fornecemos uma tradução parcial no Apêndice B em baixo.

  1. Contraditório do IPPAR entregue em 28 de Dezembro de 2005 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

  2. Parecer do IPPAR, datado de 13 de Dezembro de 2005, autorizando a segunda fase das obras na Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade, iniciadas a 22 de Novembro.

  3. Resolução 813 relativa à Arquitectura Contemporânea - Conselho da Europa, 23 de Novembro de 1983. Notícia de conferência da Unesco sobre Património Mundial e Arquitectura Contemporânea realizada em 2005 na cidade de Viena.

[Nota: os atalhos são para ficheiros pdf; use o botão direito do rato se quiser copiá-los para o seu computador.]

Para entender melhor os nossos comentários ao contraditório do IPPAR, que publicamos de seguida, é aconselhável a leitura prévia do documento 1; e também ajuda ter à mão o nosso texto da petição apresentada no Tribunal Administrativo.

I - AS AUTORIZAÇÕES DO IPPAR E A CONTAGEM DE PRAZOS LEGAIS
Nos parágrafos 8.º a 21.º da sua peça, o IPPAR argumenta que o pedido de suspensão de eficácia do parecer favorável de 9 de Junho de 2005 é extemporâneo, por já ter expirado o prazo de três meses previsto na lei para uma tal impugnação. O mais extraordinário é que, segundo os parágrafos 11.º e 12.º, esse prazo começou a contar quando as obras arrancaram, e não quando o parecer foi emitido (assim, segundo o parágrafo 12.º, a contagem ter-se-á iniciado o mais tardar a 1 de Junho, 8 dias antes de existir o parecer). Levado às suas últimas consequências, este raciocínio delirante permite que todo o parecer suficientemente tardio esteja automaticamente a salvo de impugnação, num exemplo flagrante de benefício do infractor. Além do mais, impressiona a naturalidade com que o IPPAR reconhece que, em lugar de emitir autorizações PRÉVIAS, como é sua obrigação legal, o faz só muito depois de iniciadas as obras - as quais, apesar de serem ILEGAIS antes da autorização, devem, segundo o mesmo IPPAR, entrar DESDE O INÍCIO na contagem de um prazo legal.

Dado que o IPPAR agora admite, em contradição com toda a sua postura pública anterior, que essa primeira autorização era só para a primeira fase das obras, alegadamente já concluídas - vendo-se por isso obrigado a emitir à pressa nova autorização -, a questão da impugnação ou não do parecer de 9 de Junho perde relevância para as obras actualmente em curso.

O novo parecer favorável, emitido in extremis a 13 de Dezembro, esvazia, como refere o parágrafo 24.º da peça do IPPAR, o pedido, constante da acção cautelar, de que o IPPAR fosse intimado a não proferir despacho sobre a segunda fase das obras. Contudo, à data em que a acção entrou no tribunal, a 12 de Dezembro, ainda não existia tal parecer, pelo que, ao contrário do que sugere o parágrafo 24.º, não há qualquer incorrecção a esse respeito no texto da petição.

Como é natural, o novo parecer será também objecto de um pedido urgente de suspensão de eficácia - e vamos muito a tempo de o fazer, mesmo que, pela doutrina jurídica do IPPAR, a contagem do prazo para a sua impugnação se tenha iniciado três semanas antes de ele existir.

II - O IPPAR QUER DESTRUIR O ANTIGO PARA DAR LUGAR AO NOVO
O núcleo central da defesa do IPPAR é a apologia que faz, nos parágrafos 43.º a 47.º, da integração da construção contemporânea em locais históricos. Para o efeito, refere a Resolução n.º 813 relativa à Arquitectura Contemporânea, de 23 de Novembro de 1983, do Conselho da Europa; e refere ainda a realização pela UNESCO em 2005 de uma conferência em Viena subordinada ao tema Arquitectura Contemporânea - Intervir em Centros Históricos. Sobre esta última, o documento reproduzido (em inglês) é perfeitamente inócuo, dando notícia de que existiu a conferência mas dela não reportando quaisquer conclusões; apesar disso, o IPPAR não se coíbe, nos parágrafos 43.º a 45.º, de invocá-lo em abono das suas ideias.

Quanto à citada Resolução do Conselho da Europa, há que referir que, pelo seu carácter generalista, ela está sujeita às mais díspares interpretações. Essas interpretações não têm força de lei - não têm certamente o mesmo peso que a Lei do Património Cultural, à qual a acção do IPPAR está subordinada. Pela sua natureza, tais resoluções devem condicionar, em áreas específicas, a produção legislativa de cada país, mas não substituem a Lei nem a ela se sobrepõem.

Em qualquer caso, não pode deixar de se considerar grosseira e abusiva a interpretação que o IPPAR faz da dita Resolução. É verdade, como refere o parágrafo 44.º da peça, que a Resolução defende a inclusão de elementos arquitectónicos contemporâneos em locais históricos e condena o recurso à imitação; mas, ao mesmo tempo que exorta à flexiblização das leis de protecção, a Resolução defende, em passagem que o IPPAR achou conveniente omitir da sua peça, que essas mesmas leis não podem deixar de «ser rigorosas o bastante para impedirem a destruição, a demolição e a perda» dos bens protegidos.

É portanto claro que o que a Resolução preconiza é que os NOVOS elementos arquitectónicos ADICIONADOS aos locais históricos não sejam uma imitação ou falsificação do antigo. A RESOLUÇÃO NÃO PRECONIZA - como o IPPAR interpreta no caso da Avenida dos Aliados / Praça da Liberdade - QUE O ANTIGO DEVA SER DESTRUÍDO PARA DAR LUGAR AO CONTEMPORÂNEO.

De facto, considerar que a reposição ou simples não destruição dos elementos arquitectónicos característicos da Avenida dos Aliados e da Praça da Liberdade configura um mimetismo, é tão só um desonesto jogo de palavras. Por essa ordem de ideias, qualquer obra de recuperação do património estaria ferida de mimetismo, e o IPPAR, para não ofender a sua obsessão anti-mimética, bem poderia fechar as portas; é que, vendo bem, todas as coisas são miméticas de si próprias.

O que o IPPAR no fundo quer dizer é coisa diferente: não se poderia exigir de tão grandes arquitectos que eles aceitassem trabalhar esse espaço tal como ele era, respeitando a sua memória e o seu carácter; eles não poderiam subordinar-se à arte dos jardineiros e calceteiros; e não iriam, como o Pierre Ménard de Borges, redesenhar pacientemente os mesmíssimos jardins e desenhos na calçada que outros antes deles desenharam. O IPPAR curvou-se perante os arquitectos e deu-lhes, como eles pediram, uma folha em branco.

III - O IPPAR SÓ PROTEGE EDIFÍCIOS
Nos parágrafos 68.º a 83.º da peça, o IPPAR contesta que tenha autorizado qualquer acto de demolição na Av. dos Aliados e Praça da Liberdade, pois todos os edifícios do local serão mantidos. Assim, o preceito da Lei do Património Cultural que proíbe a demolição de bens classificados ou em vias de classificação não teria sido violado: para o IPPAR, defender a preservação dos jardins e da calçada portuguesa não tem suporte jurídico e resume-se a uma questão de gosto (e, na dúvida, é o IPPAR que detém o poder discricionário de fazer valer o seu próprio gosto).

Não é verdade, mesmo à face da lei, que só os edifícios possam ser demolidos [veja o Apêndice A em baixo]; mas a questão não é apenas semântica, pois a doutrina que o IPPAR deduz dessa sua interpretação restritiva da palavra demolição é verdadeiramente perigosa: se só os edifícios podem ser demolidos, e se a lei só proíbe demolições, então tudo o mais pode destruído. Um jardim que seja parte de um conjunto protegido (como era o caso do Jardim dos Aliados) pode ser integralmente destruído com a benção do IPPAR - pois um jardim não é susceptível de ser demolido, e o IPPAR só se preocupa com demolições. E mesmo a arte de desenhar com pedras que é a calçada portuguesa não pode, por sofrer de horizontalidade, ser demolida - pode sim ser destruída, mas isso já não diz respeito ao IPPAR.

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APÊNDICES

A) O significado jurídico de demolição
[por Paulo Duarte, advogado]
Nos termos do art.2.º-g) do RJUE, as obras de demolição são definidas como «obras de destruição, total ou parcial, de uma edificação existente». O conceito de edificação, por seu turno, não se confunde com o de edifício. «Edificação», de acordo com o art. 2.º-a) do mesmo RJUE, é «qualquer construção que se incorpore no solo com carácter de permanência». Quer dizer (como se pode ler num reputado especialista em direito do urbanismo), o conceito de edificação abrange, na sua extensão, quaisquer «conjuntos erigidos pelo homem, com quaisquer materiais, reunidos e ligados artificialmente ao solo ou a um imóvel, com carácter de permanência e com individualidade própria distinta dos seus elementos».
Deve, também, prestar-se atenção ao facto de a LPC não falar em demolição de
«edifícios», nem sequer de «edificações». Alude, diversamente, à proibição de demolição de «imóveis». O conceito de «imóvel,» segundo o art.204.º do Código Civil,tem a amplitude suficiente para compreender «as árvores, os arbustos e os frutos naturais, enquanto estiverem ligados ao solo».
Esventrar o pavimento, remover a calçada, desfazer os perfis dos passeios, assassinar os jardins e liquidar as plantas é, por conseguinte, o exemplo acabado de uma operação de demolição. Porque demolir é destruir; e destruir não é só deitar abaixo (no sentido mais literal do termo).

B) Resolução 813 - Relativa à arquitectura contemporânea
Conselho da Europa, 23 de Novembro de 1983

[extractos traduzidos do texto francês]
«A ASSEMBLEIA,
1 - Tendo sido informada do relatório da sua comissão de cultura e educação na arquitectura contemporânea;
(...)
8 - Deseja:
i. associar muito mais estreitamente a população ao processo de planificação (com maior recurso aos inquéritos públicos e a uma melhor informação) e suscitar uma maior atenção para a qualidade entre os critérios da construção moderna;
(...)
9 - Chamar a atenção para a necessidade de integrar uma construção contemporânea humanizada e de qualidade no conjunto da arquitectura existente, com vista a garantir uma certa continuidade na tradição arquitectónica;
10 - Procurar assegurar o prosseguimento da expansão das cidades e vilas europeias sempre no respeito pela importância da conservação do carácter dos centros históricos existentes;
11 - Alertar para o Seminário sobre construções novas em conjuntos antigos realizado em Bristol em Março de 1982 pelo Conselho da Europa;
12 - Persuadir os organismos de planeamento a adoptarem uma atitude muito mais positiva face às possibilidades de adjunção de elementos de arquitectura contemporânea nos locais históricos, e a procurarem o apoio da opinião pública e das organizações de defesa do património para que não se recorra à imitação a não ser em casos excepcionais ou a título provisório;
13 - Insistir para que as regras relativas à gestão dos conjuntos protegidos, sem deixarem de ser rigorosas o bastante para impedirem a destruição, a demolição e a perda, sejam suficientemente maleáveis para encorajarem a inovação e não inibirem o talento.»


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Outros ÍNDICES

2.1.06

Opinião # 24 - "O absurdo, mais uma vez!"

(Enviado por ofício à C. M. do Porto em 16.03.2005; aos Grupos dos Partidos na A.M em 11.06.2005; à Delegação da Unesco em 14.06.2005 )
O absurdo, mais uma vez!
I - Em 1914 foi lançada por Elísio de Melo a proposta de construção da Avenida dos Aliados aprovada pela Câmara em 1915, sendo contratados os serviços do urbanista Barry Parker para a desenvolver.
Nas "Memórias" (Arquivo Histórico Municipal do Porto) redigidas por este engenheiro inglês, aquando das reuniões com a edilidade, pode ler-se "Longas superfícies de ruas ou de estradas somente dão uma sensação de monotonia, de fadiga, de vácuo. O planeador de hoje já não projecta ruas intermináveis em comprimento. O seu desígnio é criar quadros pitorescos em cada ponto, quadros de agradável dimensões e agradáveis proporções entre os comprimentos, larguras e alturas".
Acrescentava ainda:
"Senti que era meu dever melhorar e não destruir a boa forma e as proporções das vossas praças da Liberdade e da Trindade, aumentando mesmo, em cada uma delas a impressão de encerramento e protecção a que os planeadores de cidades dão tanta importância, quando tratando de praças como estas. Mas o que mais fará despertar a ideia de largura, de amplidão, de comprimento e de dignidade da Avenida é o ela ser parcialmente limitada por linhas convergentes em vez de o ser por linhas exclusivamente paralelas".
O edifício da Câmara
"deverá ser de frente dupla dando de um lado para a nova Praça e do outro para a Praça da Trindade. Fica dominando todo o plano".
Pretendia ‘melhorar em vez de amesquinhar a Praça da Liberdade; a Praça da Trindade não parecerá confinar desairosamente com as edificações do lado sul da praça da Liberdade ou com a Igreja da Trindade.
Resultava daí que a praça da Liberdade assumia, no projecto Barry Parker, um papel destacado: "continuará a ser o vosso principal centro de tráfico, pois que o trânsito pela nova Avenida não será muito grande".

O projecto Siza Vieira/Souto Moura altera o desenho da praça da Liberdade, pois:
-propõe a modificação da actual placa central que, de ovalizada, passa a longitudinal e alinhada com as placas da Av. dos Aliados.
-aumenta a largura dos passeios do lado poente e nascente anexando-os aos da Av. dos Aliados e que ficam plantados de árvores;
-substitui o actual piso, em pequenas pedras de basalto e calcário formando desenhos em alguns sítios, por cubos de granito escuro (segundo parece vindas da China!), que irão cobrir passeios, faixas de rodagem e o núcleo central da praça;
Como consequência, a Praça da Liberdade deixará de ser um espaço perfeitamente individualizado, para passar a ser um mero prolongamento da Avenida dos Aliados.

Aquilo que Barry Parker queria manter (‘a boa forma e as proporções’, a ‘impressão de encerramento’) e de evitar ( ‘as longas superfícies de ruas,’ 'as linhas exclusivamente paralelas’) fica gravemente comprometido com o projecto Siza Vieira/Souto Moura.
Por outro lado, não se justifica o estreitamento da Praça da Liberdade por passeios mais largos e filas de árvores pois não ocorreram modificações nos prédios adjacentes. Eles continuam com a mesma implantação e merecem, pela sua qualidade arquitectónica, continuar a serem apreciados havendo espaço livre em frente às suas frontarias e não serem, ainda que parcialmente, ocultadas por copas de árvores.

Ao apreciar-se a antevisão do projecto existente no átrio da Câmara fica-se perplexo e aturdido com semelhante ‘requalificação’. O impacto da mancha negra fazendo desaparecer os espaços ajardinados e canteiros provoca mesmo angústia. Numa cidade, onde são escassos os espaços verdes como se compreende a impermeabilização de toda a Avenida dos Aliados? Que ‘arquitectura paisagista’ é esta que nos é proposta pelo dream-team ?

Com a intervenção Siza Vieira/Souto Moura, o actual Presidente da Cãmara pretende ‘marcar seguramente a história da cidade’ (in jornal ‘Público’ de 15 de Março 2005).
Em nosso entender, o projecto dos dois arquitectos tenderá a provocar:
- uma desqualificação da praça da Liberdade tornando-a um residual da Av. dos Aliados não respeitando a sacralidade do sítio onde em 7 de Maio de 1829 foram supliciados liberais e em 1891 foi proclamada, pela primeira vez, a República.
-uma ‘requalificação’ para o conjunto Praça+Avenida que, segundo a Arq. Teresa Andresen (in Público’ de 22 Março 2005)"
opta pela neutralização da cor. Que não atende ao carácter neoclássico /beauxartiano/eclético dos edifícios circundantes, assim como do espaço avenida e do espaço praça que ali coabitam construídos ao longo do tempo e nunca de uma vez só".

Numa cidade onde a ‘Porto 2001’ deixou um ‘legado’ de espaços ‘clonados’ (Cordoaria, entre outros), o projecto Siza Vieira/Souto Moura alinha com a estratégia de descaracterização que está a tornar o Porto irreconhecível. (...)»
Continuar a ler (texto recebido hoje e publicado com autorização da A.C.E.R)

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