Opinião # 28 -"Respeitar o espaço público"
Por Gomes Fernandes- arquitecto - no Jornal de Notícias de hoje (11.01.06)
«Sabe-se pouco do que se está a passar na Avenida dos Aliados e na Praça da Liberdade
A fotografia é muito bonita e já antiga, mas retrata um quadro urbano de grande beleza e rigor de desenho, que, infelizmente, está em vias de delapidação, a cargo de dois dos mais prestigiados arquitectos portuenses contemporâneos.
Duvido que Siza e Souto Moura tenham olhado para ela, não só com "olhos de ver", mas sobretudo com olhos de compreender!
Sabe-se pouco do que se está a passar na Avenida dos Aliados e na Praça da Liberdade. O que mais vem ao conhecimento é que há polémica e contestação, que as coisas se arrastam pelas avenidas do contencioso, que o IPPAR (o mesmo do Túnel de Ceuta, não esqueçam!) meteu "os pés pelas mãos" numa manifesta incapacidade de leitura e análise cultural, a Câmara o que quer ver é a obra arrumada sem gastar um euro (louvável contabilisticamente, mas subserviente legal e urbanisticamente!) e o cidadão comum, que já acredita em muito pouco, não anda longe da posição camarária, ou seja, arrumem o assunto depressa que a paciência se esgota.
Mas a cidade ficará a perder e não é pouco. Embora, já é algum ganho ou menor prejuízo, conste que "o cavalo de D. Pedro IV" e este, porque está montado nele, já não vão ser virados ao contrário, ao que dizem, por custar muito dinheiro que a sociedade "Metro do Porto" tem agora de gerir sob maior controle. Apoio tudo que seja economizar dinheiros públicos para os aplicar melhor no interesse público, mas lamento que tenha sido sequer colocada tal hipótese pelos arquitectos, pois se D. Pedro e o seu corajoso cavalo estão naquela posição ela tem razões e justificação histórica, não foi só para virar "o rabo do cavalo" à Câmara, que, na altura, estava logo atrás, mais ou menos no local da "Menina Nua".
Com sabem, a resistência liberal do Porto, comandada pelo "rei soldado", foi sofrida porque da outra banda, na "Serra do Pilar", os miguelistas tinham instaladas as baterias de artilheiros que iam bombardeando a cidade. Ora, a posição da "Estátua de D. Pedro IV" tem a ver precisamente com isso, uma afirmação de liderança e resistência contra quem atacava a partir do sul. Não é a única razão, mas esta é histórica e forte e não deveria ter passado à margem da análise urbanística de tão responsáveis arquitectos e professores.
Esta foto revela mais algumas lições que parecem agora esquecidas O tratamento da centralidade axial do desenho da Avenida e da posição do monumento na Praça; a coexistência na placa central entre o peão e as superfícies ajardinadas; o primoroso desenho do espaço, que embora datado é sempre uma lição de rigor e beleza; a luminosidade clara e reflectora dos pavimentos em contraste com o tom mais escuro dos edifícios, o que não foi escolhido por acaso; um fecho de fundo da Praça de grande monumentalidade e anunciador de fugas visuais convidativas no sentido transversal, dos Clérigos e 31 de Janeiro.
Tudo isto e muito mais, numa fotografia que poderia ser saudosa e salutar memória cultural da "sala de visitas" de uma cidade que sabe receber, mas que ficará só como "saudosa", porque "salutar" não a souberam entender os dois prestigiados arquitectos.
Fica uma vez mais em aberto uma questão fundamental é preciso que o Porto seja mais discutido, que haja maior e mais sereno debate sobre questões vitais do desenho e da transformação da cidade. Intervir no "Espaço Público" requer a presença obrigatória do arquitecto, mas não se esgota na sua mesa de trabalho. O destinatário é o cidadão, a quem se exige - como tal se deve conferir o direito! - uma responsabilização cívica e cultural e ela só pode ser garantida se ele tiver acesso à informação e conheça, atempadamente, as regras da participação.
Rigorosamente o contrário de tudo que foi feito pela "Porto 2001" e agora pela "Metro do Porto", e que poderia ter evitado algumas aberrações feitas, com custos que no futuro ainda vamos ter de amargar.»
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«Sabe-se pouco do que se está a passar na Avenida dos Aliados e na Praça da Liberdade
A fotografia é muito bonita e já antiga, mas retrata um quadro urbano de grande beleza e rigor de desenho, que, infelizmente, está em vias de delapidação, a cargo de dois dos mais prestigiados arquitectos portuenses contemporâneos.
Duvido que Siza e Souto Moura tenham olhado para ela, não só com "olhos de ver", mas sobretudo com olhos de compreender!
Sabe-se pouco do que se está a passar na Avenida dos Aliados e na Praça da Liberdade. O que mais vem ao conhecimento é que há polémica e contestação, que as coisas se arrastam pelas avenidas do contencioso, que o IPPAR (o mesmo do Túnel de Ceuta, não esqueçam!) meteu "os pés pelas mãos" numa manifesta incapacidade de leitura e análise cultural, a Câmara o que quer ver é a obra arrumada sem gastar um euro (louvável contabilisticamente, mas subserviente legal e urbanisticamente!) e o cidadão comum, que já acredita em muito pouco, não anda longe da posição camarária, ou seja, arrumem o assunto depressa que a paciência se esgota.
Mas a cidade ficará a perder e não é pouco. Embora, já é algum ganho ou menor prejuízo, conste que "o cavalo de D. Pedro IV" e este, porque está montado nele, já não vão ser virados ao contrário, ao que dizem, por custar muito dinheiro que a sociedade "Metro do Porto" tem agora de gerir sob maior controle. Apoio tudo que seja economizar dinheiros públicos para os aplicar melhor no interesse público, mas lamento que tenha sido sequer colocada tal hipótese pelos arquitectos, pois se D. Pedro e o seu corajoso cavalo estão naquela posição ela tem razões e justificação histórica, não foi só para virar "o rabo do cavalo" à Câmara, que, na altura, estava logo atrás, mais ou menos no local da "Menina Nua".
Com sabem, a resistência liberal do Porto, comandada pelo "rei soldado", foi sofrida porque da outra banda, na "Serra do Pilar", os miguelistas tinham instaladas as baterias de artilheiros que iam bombardeando a cidade. Ora, a posição da "Estátua de D. Pedro IV" tem a ver precisamente com isso, uma afirmação de liderança e resistência contra quem atacava a partir do sul. Não é a única razão, mas esta é histórica e forte e não deveria ter passado à margem da análise urbanística de tão responsáveis arquitectos e professores.
Esta foto revela mais algumas lições que parecem agora esquecidas O tratamento da centralidade axial do desenho da Avenida e da posição do monumento na Praça; a coexistência na placa central entre o peão e as superfícies ajardinadas; o primoroso desenho do espaço, que embora datado é sempre uma lição de rigor e beleza; a luminosidade clara e reflectora dos pavimentos em contraste com o tom mais escuro dos edifícios, o que não foi escolhido por acaso; um fecho de fundo da Praça de grande monumentalidade e anunciador de fugas visuais convidativas no sentido transversal, dos Clérigos e 31 de Janeiro.
Tudo isto e muito mais, numa fotografia que poderia ser saudosa e salutar memória cultural da "sala de visitas" de uma cidade que sabe receber, mas que ficará só como "saudosa", porque "salutar" não a souberam entender os dois prestigiados arquitectos.
Fica uma vez mais em aberto uma questão fundamental é preciso que o Porto seja mais discutido, que haja maior e mais sereno debate sobre questões vitais do desenho e da transformação da cidade. Intervir no "Espaço Público" requer a presença obrigatória do arquitecto, mas não se esgota na sua mesa de trabalho. O destinatário é o cidadão, a quem se exige - como tal se deve conferir o direito! - uma responsabilização cívica e cultural e ela só pode ser garantida se ele tiver acesso à informação e conheça, atempadamente, as regras da participação.
Rigorosamente o contrário de tudo que foi feito pela "Porto 2001" e agora pela "Metro do Porto", e que poderia ter evitado algumas aberrações feitas, com custos que no futuro ainda vamos ter de amargar.»
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